quarta-feira, 7 de outubro de 2009

" 10 de maio de 1771

Uma serenidade admirável domina minha alma inteira, semelhante à doce manhã primaveril que eu gozo de todo o coração. Estou tão só e minha vida é feita de alegrias por viver numa região que parece ter sido criada para almas como a minha. Estou tão feliz, meu amigo, tão mergulhado na sensação de minha calma existência, que minha arte sofre com isso. Não poderia desenhar nada agora, nem sequer um traço, embora jamais tenha sido tão grande pintor quanto neste instante. Quando a bruma do vale se levanta a minha volta, e o sol altaneiro descansa sobre a abóbada escura e impenetrável da minha floresta, e apenas alguns escassos raios deslizam até o fundo do santuário, ao passo em que eu, deitado no chão entre a relva alta, na encosta de um riacho, descubro no chão mil plantinhas desconhecidas... Quando sinto mais perto de meu coração a existência desse minúsculo mundo que formiga por entre a relva, essa incontável multidão de ínfimos vermes e insetinhos de todas as formas e imagino a presença do Todo-poderoso, que nos criou a sua imagem e semelhança, e o hálito do Todo-amado que nos leva consigo e nos ampara a pairar em eternas delícias... Ah, meu amigo, quando o mundo infinito começa a despontar assim ante meus olhos e o céu se reflete todo ele em minha alma, como a imagem de uma amada... Então suspiro profundamente e penso: Ah! Pudesses tu voltar a expressá-lo, pudesses tu exalar o sentimento e fixar no papel aquilo que vive em ti com tanta abundância e tanto calor, de maneira que o mesmo papel pudesse se fazer o espelho do Deus infinito! Meu amigo! Mas vou ao chão ante isso, sucumbo ante o poder e a majestade dessas aparições. "

(Os sofrimentos do Jovem Werther. Goethe.)


Quero ler de novo.

E, de preferência, com uma bela garrafa de tequila ao lado.


Um comentário:

  1. Concordo com a parte de ler de novo com uma garrafa de tequila!
    Ah, uma infinita sensação em perceber o mundo e seu tamanho, não é mesmo? Sentir é mesmo um processo doloroso, sinto até hoje como o vento, a música, os quadros de exposições em museus, sexo, chocolate, vinho, o zero da prova quanto um 9 ou um 10, essas coisas todas me afetam de uma maneira como se minha alma quisesse sair do meu corpo sem a minha vontade. Não é como dormir. Fico revoltado quando eu pego um ônibus e vejo as pessoas vazias sentadas preocupadas apenas em agradar um chefe que, sabemos, não está nem aí pro seu empregado ou se ele tem sentimentos. Pessoas são vazias. Não todas, mas só aquelas que acham que mulheres só se enteressam por dinheiro e carro e mulheres que pensam que são assim também.
    Falei demais e acabei me perdendo, desculpa.
    Fico alegre depois de ler um bom texto.
    Boa noite, até a próxima!

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